terça-feira, 26 de julho de 2011

O Brilho do Negro

Não, pessoal, este não é um texto sobre a consciência negra, nem qualquer tipo de manifesto politicamente correto.  É apenas um texto sobre física!

Depois de falar sobre "corpo negro" e "espectro contínuo" no post sobre Iluminação Xenon x Halógena foi que eu descobri que falei grego para muita gente!  Desculpem, essa é uma falha comum dos técnicos.  Falamos "tecniquês" sem nem percebermos...

Mas então vamos falar um pouco sobre isso, e tentar esclarecer essa história de espectros.  Ahhh... mas cuidado, "espectro" aqui refere-se apenas a iluminação e cores.  Não vamos nem tentar explicar sobre fantasmas e fenômenos paranormais...

Nosso universo está coberto por radiação eletromagnética.  Em toda parte existe essa radiação - parte natural, parte produzida pelo Homem.  Ondas de rádio fazem parte desse conjunto.  O calor emitido pelo Sol também.  Assim como a luz visível.  E raios invisíveis, como os UV (ultra violeta) e Raios X.

A diferença fundamental entre todos esses tipos de radiação é o comprimento de onda.  As ondas de rádio são bastante longas - desde 300m para as rádios AM, passando por uns 3m para as rádios FM, até cerca de 15cm para micro ondas e algumas bandas de telefonia celular.

Bem mais curta é a radiação infravermelha, que sentimos sob a forma de calor (quando estamos ao sol, o calor que sentimos onde o sol "bate" é proveniente dessa radiação), que tem entre 0,3mm e 750nm.  Um nm (nanômetro) é um bilionésimo do metro, ou um milionésimo de milímetro.

A partir daí vem a luz visível, entre 750 e 380nm.  Nossos olhos vêem esses diferentes comprimentos de onda como diferentes cores.  A partir dos 380nm estão o ultravioleta e raios X, invisíveis para o olho humano.

Tudo isso é muito interessante, mas vamos nos focar na luz visível e como a percebemos.  Se olharmos para um espectro visível como este abaixo, veremos a relação aproximada entre comprimento de onda e a cor que nossos olhos percebem:
Percebemos as ondas mais curtas como violeta, e as mais longas como vermelho.  Perto do centro está o verde, com cerca de 520nm.

Reparem que várias cores, entre elas o branco, não estão nesse espectro.  Não existe uma frequência "branca".  O branco é o que nossos olhos percebem quando nos chega todo o espectro ao mesmo tempo, com toda essa gama de frequências.

Um objeto branco reflete a luz que incide sobre ele.  Só o percebemos como branco se o iluminarmos com luz branca!  Por exemplo, iluminem uma parede branca com uma lâmpada vermelha, e vocês verão a parede vermelha.  Óbvio, não?  Portanto, só podemos perceber corretamente as cores dos objetos se os iluminarmos com luz branca!

Agora vamos ao corpo negro...

Qualquer objeto aquecido emite radiação.  Inclusive nós, já que nossa temperatura de 36,5ºC é suficiente para emitirmos infravermelhos.  à medida em que aquecemos mais um objeto, ele passa a emitir mais radiação, e em comprimentos de onda menores.  Coloquem uma barra de ferro sobre o fogo, e em pouco tempo ela começa a "ficar vermelha".  Sua temperatura subiu e, perto dos 600ºC, ela começa a emitir luz visível, além da infravermelha.  Continuem aquecendo-a e ela irá brilhar cada vez mais, passando a laranja e depois amarelo.  Não vai passar do amarelo, pelo menos como uma barra de ferro sólida, porque a cerca de 1.500ºC ela vai derreter.

Observem este gráfico:
A linhas brancas mostram quanta radiação, e de que comprimento de onda, emite um corpo aquecido, em várias temeraturas diferentes.  A linha mais baixa é de um corpo a 3.500ºK (cerca de 3.227ºC).  A mais alta é de um corpo a 5.500ºK (cerca de 5.227ºC).  No meio do gráfico está representado o espectro visível.  À sua direita, a área negra é de radiação IR (infravermelha), e à esquerda a UV (ultra violeta), ambas invisíveis.

Reparem que, a 5.500ºK, a parte mais importante da radiação emitida está bem na faixa visível ao olho humano.  Não é coincidência, já que esta é a temperatura superficial do Sol, portanto essa é a curva de radiação que ilumina a nossa Terra.  E nossos olhos, é claro, evoluíram nesse ambiente, adaptando-se para enxergar a radiação que aqui existe em maior quantidade!

Esse tipo de emissão de luz é  chamado de "emissão de corpo negro" porque a radiação emitida depende apenas da temperatura do corpo, e não de sua cor.  Um corpo negro, que normalmente não emite luz visível (por isso negro), ao ser aquecido emitirá exatamente esse espectro luminoso.

E agora, depois de tantas explicações, finalmente chegamos às lâmpadas e à iluminação automotiva!

Uma lâmpada incandescente brilha porque seu filamento é aquecido, pela passagem de corrente elétrica, o suficiente para emitir luz visível.  Uma lâmpada comum tem seu filamento aquecido a cerca de 3.200ºK.  Uma halógena automotiva é um pouco mais quente - cerca de 3.400ºK.  Se olharmos no gráfico acima, veremos que a maior parte da radiação emitida por ela é infravermelha, e não luz visível!!

Que horror!! Por isso uma lâmpada incandescente tem eficiência tão baixa - menos de 20%.  E por isso ela aquece tanto o que está por perto - ela emite um monte de radiação IR!!  E por isso sua luz é um pouco "amarelada" - ela emite mais luz no  extremo vermelho-amarelo do espectro do que no extremo azul-violeta.

As lâmpadas de descarga, sejam as de baixa intensidade (vapor de sódio ou mercúrio) ou de alta intensidade (Xenon) emitem luz em uma (ou algumas) frequências isoladas, e não em um espectro contínuo como o do gráfico.  Seu princípio de funcionamento é radicalmente diferente.  Com isso, consegue-se produzir uma emissão quase totalmente dentro do espectro visível - mais de 70% da energia, em alguns casos.  Essa é a boa notícia!

Mas também há uma má notícia:  Como o espectro não é contínuo, nós não estamos "iluminando a parede" com uma luz branca, mas sim com uma mistura de cores isoladas.  Em alguns casos, como na luz de Sódio, essas cores são predominantemente amarelas, e sob sua iluminação vemos tudo amarelo e meio sem cor.

Em outros, como na Xenon, essa mistura nos aparece como branco.  Mas será branco mesmo?  Infelizmente não.  É uma mistura de algumas frequências, bem diferente do espectro da luz natural do Sol, que até consegue enganar nossos olhos.  Até que iluminemos com essa luz um objeto colorido.  E aí vamos ver as cores distorcidas.  Algumas cores podem quase sumir, enquanto outras ficam mais brilhantes, ou parecem diferentes.

E é esse o argumento que alguns apresentam contra a iluminação HID em automóveis.  Em uma situação de emergência - um objeto cruzando subitamente a estrada à nossa frente - a falsa impressão de cores pode enganar nossos olhos, fazendo com que o cérebro leve alguns segundos a mais para interpretar corretamente o que está vendo.  E esses segundos podem ser fatais!

Será válido esse argumento?  Não sei.  Não existem ainda estudos sérios, com dados confiáveis, sobre esse efeito.  Mas é um argumento com base lógica, e como tal deve ser devidamente tratado, e estudos realizados.

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